Cenários de descarbonização: oportunidades e incertezas da precificação de carbono

Com o objetivo de orientar os negócios para tomada de decisões alinhadas com os desafios da transição para uma economia de baixo carbono, modelamos neste estudo volumes e preços dos instrumentos de precificação de carbono até 2050, considerando cenários estabelecidos pelo Intergovernmental Panel on Climate Change (IPCC).

Foram mapeados e analisados os instrumentos de precificação globais em operação em mercados regulados, incluindo sistemas de comércio de emissões (emission trading systems – ETS, em inglês) e taxas sobre o carbono, além do potencial de crescimento do mercado voluntário. 

Os avanços regulatórios globais também foram modelados, já que são um importante direcionador do volume de emissões precificadas globalmente, com expectativa de regras cada vez mais restritivas e aumento da cobertura de emissões precificadas em vários países.

Além do volume de emissões, foi modelada a elasticidade de preço por meio da análise do seu comportamento histórico em diferentes países, considerando a efetividade dos mercados de carbono e o estágio de desenvolvimento do país.

O relatório inclui ainda uma análise sobre o potencial brasileiro por tipo de crédito abordando os seguintes tópicos: 

  • Energia renovável
  • REDD+
  • ARR
  • Agropecuária de baixo carbono
  • Carbono azul
  • Resíduos e biogás
  • Hidrogênio verde e de baixo carbono
  • CCUS 

O estudo conclui que o desafio de descarbonização global é grande, assim como o potencial financeiro para os instrumentos de precificação de carbono nos próximos anos, sendo necessária uma movimentação de mais de US$ 8 trilhões anuais e preço médio de R$ 240/tCO2e em 2050 para atingimento de trajetória de 1,5°C.

O Brasil tem um grande potencial para se beneficiar com o avanço dos instrumentos de precificação de carbono e caminha em direção a um mercado nacional regulado.

Nesse sentido, para empresas brasileiras de diversos setores econômicos que podem ser impactadas pelo mercado de carbono direta ou indiretamente, é urgente a tomada de ações relacionadas à preparação para o novo contexto regulatório de baixo carbono, buscando oportunidades para inovar seus modelos de negócios e investir em novas tecnologias.

 


Instrumentos de precificação de carbono e o desafio climático

O carbono é precificado de duas formas principais em regulações: ETS e taxas sobre o carbono. No ETS, define-se um limite máximo de emissões setoriais, permitindo que empresas que emitem menos do que o limite estabelecido para seu setor vendam suas permissões para outras empresas com emissões maiores, a um preço que, normalmente, varia conforme a oferta e a demanda. Na taxa de carbono, define-se um valor a ser pago pelas emissões de empresas de setores específicos, especialmente os carbono-intensivos.

O acordo de Paris, de 2015, incluiu instrumentos de precificação de carbono como umas das principais estratégias para que as nações consigam atingir suas metas de redução de emissões de GEE. Nesse acordo, líderes mundiais se comprometeram a tomar medidas para limitar o aumento de temperatura global a menos de 2°C, idealmente 1,5°C, até o fim do século.

Para atingir esse objetivo, o mundo deve reduzir suas emissões de GEE em cerca de 90% e atingir emissões líquidas iguais a zero – o Net Zero – até 2050. No entanto, nossas ações até o momento foram insuficientes e, entre 2016 e 2021, as emissões globais apresentaram um aumento de mais de 3%, impulsionado por países asiáticos, em especial a China.

O Acordo de Paris prevê também a cooperação internacional, permitindo que um país transfira créditos de carbono obtidos por meio de sua redução para outros países, ajudando-os em suas metas de descarbonização e estabelecendo um mercado global de carbono.

Mais de 20 países já estão envolvidos em acordos climáticos bilaterais – a Suíça lidera o tema, com 12 acordos internacionais firmados.

Mais de 20 países já estão envolvidos em acordos climáticos bilaterais – a Suíça lidera o tema, com 12 acordos internacionais firmados

Cobertura global de instrumentos de precificação de carbono

A Europa e os outros dez países mais emissores – China, Estados Unidos, Índia, Rússia, Brasil, Indonésia, Japão, Irã, Arábia Saudita e México – representaram aproximadamente 75% das emissões globais em 2022. A maior parte dessas regiões já têm instrumentos de precificação vigentes ou em consideração, com exceção da Índia, Rússia, Arábia Saudita e do Irã, que representam 15% das emissões globais.

Já nos Estados Unidos, um sistema de precificação de carbono nacional está longe de ser realidade, mas 14 estados   já têm precificação de carbono própria e outros consideram implantá-la no futuro

Para atingir 40% de emissões reguladas em 2050, mais países devem estabelecer instrumentos de precificação e os que já têm precisam evoluir sua cobertura.

Para atingir 40% de emissões reguladas em 2050, mais países devem estabelecer instrumentos de precificação e os que já têm precisam evoluir sua cobertura.

Potencial financeiro dos instrumentos mundiais de precificação de carbono

O desafio da descarbonização global é grande, assim como o potencial financeiro dos instrumentos de precificação de carbono. O avanço da regulação constitui um importante driver na descarbonização do planeta, e a expectativa é de que os instrumentos de precificação mundiais correspondam a cerca de US$ 1,9 trilhão a US$ 8,4 trilhões   em 2050, a depender da trajetória de descarbonização global.

Em um cenário otimista de redução de emissões, a movimentação financeira com instrumentos de precificação de carbono, incluindo mercados e taxas, pode atingir mais de US$ 1,1 trilhão em 2030 e US$ 8,4 trilhões em 2050.

Em um cenário otimista de redução de emissões, a movimentação financeira com instrumentos de precificação de carbono, incluindo mercados e taxas, pode atingir mais de US$ 1,1 trilhão   em 2030 e US$ 8,4 trilhões em 2050.

Tendências de preços de carbono

O preço médio global do carbono deve seguir uma tendência de crescimento, especialmente os instrumentos regulados, atingindo entre US$ 130 a 240/tCO2e em 2050, um aumento de 3% a 5% ao ano no preço médio global, que girou em torno de US$ 70/tCO2e em 2022.

Entretanto, é relevante ressaltar que os preços variam entre cada território e, enquanto alguns preços na Europa já ultrapassam os US$ 100, a média nos países em desenvolvimento é de apenas US$ 3. Além disso, os instrumentos de precificação de carbono ainda estão muito concentrados em países desenvolvidos, responsáveis por 98% da receita total, impulsionados pelo ETS da União Europeia – que corresponde a metade desse valor.

Legislação brasileira

A legislação sobre mercados de carbono está em tramitação na Câmara dos Deputados, com a recente aprovação do Senado do Projeto de Lei nº 412/2022, que pretende criar um Sistema Brasileiro de Comércio e Emissões de Gases de Efeito Estufa (SBCE) e incluir todas as empresas que emitem mais de 25 mil tCO2e anuais, excluindo as atividades agropecuárias primárias.

O Brasil já tem  , desde 2017, com a aprovação da Política Nacional de Biocombustíveis (RenovaBio), um mecanismo que cria incentivos para biocombustíveis a partir da precificação de carbono com foco na distribuição de combustíveis. A Política estabelece metas de descarbonização para distribuidores de combustíveis, permitindo seu atingimento por meio da compra de Créditos de Descarbonização (CBIOs), que correspondem a uma tonelada de CO2 evitado na cadeia de valor O2 ao substituir combustíveis fósseis por renováveis.


Potencial brasileiro de oferta de créditos de carbono

O Brasil tem uma curta janela de oportunidade para se posicionar como grande exportador de créditos de carbono, dado o grande potencial florestal do país.

A participação brasileira no mercado voluntário é relevante, ocupando a 5ª posição em volume de créditos gerados, atrás de Índia, China, EUA e Indonésia. Em 2030, o Brasil poderá ser um dos maiores exportadores de créditos de carbono globais, com oferta que pode representar 10% de todas as emissões precificadas em mercados no mundo  , impulsionado pelas soluções baseadas na natureza, como projetos de preservação REDD+ (do inglês, Reducing Emissions from Deforestation and Forest Degradation) e de restauração ARR (do inglês, Afforestation, Reforestation and Revegetation), que já representam mais da metade da oferta brasileira.

O pico de oferta de créditos brasileiros deve ocorrer em 2035 – o aumento na oferta é mais rápido no cenário de 1,5°C. 

Oferta brasileira de créditos – em MtCO2e O2

Conclusão 

Os próximos anos serão marcados por esforços de descarbonização mundiais para limitar o aquecimento global. Alguns setores conseguirão atingir suas metas apenas por meio da redução de suas emissões. 

No entanto, grande parte dependerá de créditos de carbono para complementar seus esforços. Esse contexto deve acelerar a adoção de instrumentos de precificação de carbono mundialmente, assim como levar a um aumento dos preços, viabilizando cada vez mais a adoção de novas tecnologias de redução e captura de carbono.

O Brasil, além de precisar agir para reduzir as próprias emissões, tem o potencial de suprir parte significativa da demanda mundial por créditos de carbono, em especial por meio de soluções baseadas na natureza. No mercado global, devido aos ajustes correspondentes previstos no Acordo de Paris, as emissões negociadas internacionalmente só podem ser reconhecidas por um território, e, por isso, o Brasil deve construir estratégias para atingir as próprias metas, sem deixar de assegurar sua participação no mercado global.

O próximo passo importante está prestes a ser dado: a evolução para um mercado regulado brasileiro, que contribuirá para um impacto real na redução de nossas emissões e para nosso posicionamento como protagonistas na descarbonização global. 

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Adriano Correia

Adriano Correia

Sócio e líder da indústria de Energia, Strategy& Brazil

Daniel Martins

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Sócio e líder de Energia para Advisory, Strategy& Brazil

Vandré Pereira

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Sócio, Strategy& Brazil

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